quarta-feira, 18 de novembro de 2009
Achados da Roça - Espinhela Caída
Segue outro semi-causo-trecho desconexo de estórias capialescas, inacabadas, como tudo até aqui. (atualizada em 10/05/2020)
"- É que desatinei do avesso, dotô, que nem Sêo Limpo deu jeito na espinhela minha. Declarou que tava caída de vez...trabalho pra maior potência de reza, que ele nem num tinha. Tem nada. Temporão, isso tudo.
Bobo fosse eu, marrava pedra no pescoço e pulava da pinguela na água gelada do córgo da baixada. Assombrei foi só na hora, que calado passei a ficar depois, e o costume vem me voltando. Artes de paciência aprendi , ademais, com mestre de gabarito, nem num foi?
Arre! que agora me volta o tino, a vergonha é tanta do quase-medo-pavor, nem... Ontem ainda veio, de soslaio, o tino ruim: era competência de falta de oração, creio. Sei que dotô conhece a mãe que tem, e de dívida que tenho com seu povo eu nem num falo. Mas será que, assuntando com ela, agora que tá boa dos ares de novo, ela num há de fazer a arribada de espinhela minha não?
Medo medo, nem num tenho, me volto pra paz lenta natural. Mas pro regular da cisma quietar, há de um espargir da erva molhada que só Sinhá Tonha - abençoada seja sempre- faz. Aquilo é sem igual em poder nesse gerais.
Modo que então, devidamente ungido de mato por dona Tonha, é que posso voltar pro assossego regular, lembrado do valor que humildemente colhi nesta vida. Vida de matutâncias veladas, de passos longos despressados, mel de jataí tomado no favo tirado pela mão própria que monta esse paioso fedido).
É lembrado dessa vida que olho com boa vista pro inimigo, de arriba pra baixo, e largo o passado arriado, sem peso pra caminhar pelo calendário que me fornecer o Ele. Ão. "
Tal papo findado, o matuto recolhido vê a força nos pés e mãos, a calma confiante de sempre retornando, antecipando a benzeção de Dona Tonha. O incômodo calor entre o pescoço e o peito e a prostração que sentiu nos últimos dias achariam fim nas mãos de Antônia Osório, companheira de João Osório e reconhecidamente eficaz na arte de cura com ervas naturais e orações sussurradas. Competência atestada pelos raríssimos indivíduos que dessa graça gozaram. Necessária era tal intervenção, dado que nem Sêo Limpo (Olimpo de nascimento), ancião benzedor de longa fama, logrou força suficiente para desfazer a 'queda de espinhela' do pobre capiau.
Voltou então à sua cabana, erguida nos arredores do pomar, ao fundo da casa grande, não sem antes bater a botina na soleira, remover o chapéu de vaqueiro e pisar firme com pé direito; galgou 3 ou 4 passos até a santinha de bronze que pendia dum barbante preso a um dos caibros de madeira no meio do cômodo único. Levou o dedo indicador à cabeça do ícone e em seguida tocou a testa, fazendo o tríplice sinal de cruz, tal qual fora ensinado pela saudosa mãe. Aquietou-se, então, no canto de dormir, bateu a poeira da esteira de bambú, tirou o calçado, e deitou tranquilo, certo da cura que chegaria logo ao alvorecer. Sonhou com mãos enrugadas, e cheirando à boldo.
"
18/11/2009
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Um comentário:
A sua maior fã pede, clama, exiiiige atualizações.
Gordo.
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