segunda-feira, 21 de junho de 2010

Malessência (conselho de moço)



Sêo Olimpo e o matuto, no caminho pro armazém. O velho homem
desconfia que o rapaz bem captou a sombra em sua feição, ainda
que disfarçada no peso da idade e do cansaço. Abre a prosa sem medo
ao capiau, que em sua imberbe lucidez, alguma gota de ajuda bem
poderia trazer.

- Num sabe filho, que é como que nem a fonte - a água não estando -
resseca, junto o afã, o desembestamento. E a vida amorna, de maus calores. 
Embate besta cá dentro se assenta, pra depois diluir, espalhar. Aperta e arrocha. Que mesmo já nem sei arte alguma de desatância que dê jeito... um nó bem dado na goela, esse tem sido, vice?

Continua o velho cafuzo.

- Desidratado ser eu vi aqui, que mais nem quero adentro olhar, de mim, ... Artes que, de curandeiro, me virei foi um paciente em desvontade. Que chama miúda é essa que me desaquece por dentro?

Deixa dada, o rosto do moço se ilumina.

- Ixi, pois creia, sô Limpo, que em desaviso não me pega essa escurecência de semblante do sinhô. Se nada assuntei, foi porque em aperto de dentro, a autoridade de falar é do dono da alma.

- De pronto falo que em cidade chamam de doença, mal do século, pânico, depressão e escambau. Mas de cá bem suspeito não ter nome pr'esse azedume, e assim como vem, há de ir, sorrateiro no descuido de outro ser com cabeça mais enfraquecida.

- Carece mesmo - perdoa a ousadia do conselho - é guardar parte d'alma pra si. Sinhô que na lida reviver espinhela caída e desfazer quebranto muito se cansou, bem tenho visto. Diz que na fortaleza e na inocência de luz forte dum ser, mal bobo se torna essa sombra na testa, há de.

O ancião, olhar perdido nas folhas da goiabeira furadas de sol...

-Há de, filho. Há de.

GB - Junho 2010

domingo, 23 de maio de 2010

Equilíbrio Instável


Incauto incerto e perene

Trôpego trepidante retilíneo

Viajante vago e sóbrio

Reerguido céu de ocaso


Arauto do silêncio em sol maior

Sustido atém-se desamparado

Ascende encosta abaixo


Pentagrama de fótons apagados.


Certeza de (um) ser único.


GB

maio 2010


sexta-feira, 5 de março de 2010

Estou virando um tiozão geek-jeca?


Num sei d'onde veio isso, mas uma curiosidade mórbida em desmonte e fuçação de coisas tomou conta do meu ser, de tal maneira que nas últimas semanas, pouco faço na web que não seja ler algo sobre BIOS, motherboard, CMOS e afins. Me pego olhando preços de ferramentas pra abrir e fuçar meu computador, ou peças pra acrescentar no PC, ou miniaturas de veículos e aviões em escala, para montagem, pintura e colagem.

Tudo bem que sempre tive uma queda pra coisas no estilo ''howstuffworks'', mas geralmente ela se mantinha no plano das idéias fundas(não confundir com profundas), daquelas que não vem à tona e não tomam parte no pensamento corriqueiro. Ademais, os 6meses de ciência da computação poderiam ter deixado algum rastro no meu interior, mas longos 5 anos passaram-se desde aquela época, e num sei porque só agora surgem pensamentos e atitudes nerdísticas de jovem mancebo recém saído da puberdade.

Claro que nunca deixei de lado as ambições de montar minha oficina de garagem, com todas as ferramentas e parafernálias mecânicas pra dar manutenção nos meus futuros 'filhotes' de metal e plástico, mas isso não me tomava o tempo útil pesquisando sobre o que fazer pra tornar o sonho real.

Assumo que li Kafka alguns dias atrás, com sua espantosa Carta ao Pai, mas nada que me remetesse diretamente à metamorfose, e ainda sim, me olhei do teto e vi um inseto rastejante no insubstancial mundo da web, geek-jequisses e afiliados. Acho que tinha trauma da ''porta trancada", não sabia, e acabo de me curar.


G. Borges